5 de abril de 2012
O fenômeno do jornalismo de poltrona
Na era do jornalismo fast food, ganha corpo uma tendência que contraria tudo aquilo que vem sendo cantado em prosa e verso pelos defensores da leitura instantânea. É o crescimento dos interessados no chamado jornalismo de formato longo ( inglês long format journalism), uma modalidade de jornalismo que entre nós também é conhecida como grandes reportagens, ensaios ou pensatas.
No começo deste ano, uma reportagem de aproximadamente duas mil palavras (quilométrica nos padrões dos 140 caracteres do Twitter) publicada pela revista norte-americana Forbes foi vista por três milhões de leitores e recebeu espantosos dois mil comentários. O fenômeno levou Lewis DVorkin, diretor de produtos jornalísticos do grupo Forbes, a pesquisar os índices de audiência de outros textos longos publicados pela empresa. E a surpresa foi total.
Os resultados mostraram que nada menos que 12 textos publicados desde janeiro e que tinham no mínimo 1.500 palavras haviam conseguido índices de audiência superiores a 500 mil leitores (page views, jargão para páginas visitadas) .É muito mais que a média das noticias curtas publicadas pela revista e que são apontadas com modelo preferido dos leitores online.
Mas não é só isso. O crescimento do jornalismo de poltrona, em que o leitor senta para ler, ao contrário do jornalismo fast food geralmente consumido em pé, em intervalos ou em movimento, tornou-se possível graças à multiplicação de sites na internet voltados exclusivamente para textos longos, como é o caso do Longreads e ferramentas como o Read it Later (leia mais tarde).
O novo filão comercial não demorou a ser descoberto também pela livraria virtual Amazon, que criou oprojeto Kindle Single, em que podem ser publicados textos de 5 mil a 30 mil palavras. Em meados de março, a Amazon anunciou que já vendeu 2 milhões de textos desde o lançamento do projeto, em 2010. O número é pequeno no mar de megacifras da internet, mas é tido como surpreendente num contexto onde todo mundo apostava que os textos longos continuaria um monopólio do impresso.
Outro fator que contribuiu para aumentar a leitura de textos longos foi a popularização dos tablets (iPad e similares) e livros eletrônicos (tipo Kindle e Nook), bem como dos telefones inteligentes (smartphones) com telas de cinco ou mais polegadas que facilitam a leitura em dispositivos móveis.
Até a virada do século, o jornalismo de poltrona era um quase monopólio das edições dominicais dos jornais e das revistas semanais. Com a crise do modelo de negócios dessas duas modalidades de empresas jornalísticas, o gênero dos textos longos acabou pagando o preço dos problemas corporativos. A modalidade ressurge agora amparada por um novo formato que torna ainda mais acessível a ubíqua a leitura de grandes reportagens e ensaios.
Isso revela que as novas tecnologias não necessariamente são um sinônimo de superficialidade e cultura rasa. O fenômeno do longo formato mostra que o gênero fast food e o jornalismo de poltrona podem conviver bem e funcionar como complemento um do outro. No site Longreads, há textos de mais de 10 mil palavras que receberam uma versão fast food para atrair leitores.
No caso específico do material publicado em plataforma digital, existe a vantagem adicional de os textos poderem ser complementados com vídeos e principalmente incorporarem a interatividade com os leitores, o que aumenta a riqueza da produção intelectual tanto de quem escreve como de quem lê.
Carlos Castilho para o Observatório da Imprensa
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